segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Aziz Ab'Sáber critica o projeto de transposição das águas do rio São Francisco

Reunião SBPC - 21 Jul 2008

"Deveriam conhecer melhor de planejamento e da climatologia dinâmica
das regiões envolvidas", disse


*Aziz Nacib Ab'Sáber, professor emérito da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), criticou o
projeto de transposição do rio São Francisco durante palestra na 60ª
Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC), em Campinas.
Por Thiago Romero, de Campinas (SP), para a *Agência FAPESP.*

O polêmico projeto de transposição consiste na transferência de águas do
rio para abastecer rios e açudes da região Nordeste. Ab'Sáber criticou a
falta de planejamento e estudos climáticos sobre as áreas que irão
fornecer e receber águas.
"O projeto diz que será preciso tirar 1% das águas do rio para transpor
por cima da chapada do Araripe e descer para o Ceará. Quem chegou a essa
conclusão deveria conhecer melhor a climatologia dinâmica dessas
regiões, que faz com que as águas do rio fiquem mais altas ou mais
baixas, dependendo da época do ano. Essa porcentagem pode significar uma
réstia de água em um momento ou, durante o período de chuvas nos sertões
do Ceará e do Rio Grande do Norte, por exemplo, nem seria preciso enviar
água do São Francisco", disse.
A poluição das águas do rio também foi abordada pelo geógrafo. "Ninguém
me convence de que a transposição fornecerá água potável para todos os
que teoricamente se beneficiarão com o projeto. As pessoas que afirmam
isso não entendem bem de planejamento. A justificativa é muito simples:
as águas do São Francisco estão poluídas", observou o geógrafo de 83
anos, presidente de honra da SBPC, a uma platéia que lotou um dos
auditórios de maior capacidade na Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp).
"Elas vêm desde a serra da Canastra e passam por muitos rios em áreas
onde a cultura de soja está se estendendo com a utilização de grande
quantidade de defensivos agrícolas. O rio recebe ainda a poluição que
vem de rios das cidades de São Paulo e Belo Horizonte", explicou o autor
de diversas teorias e projetos inovadores na geografia brasileira.
Ab'Sáber disse não ser contra o projeto de transposição, desde que seus
gestores sejam corretos e não se envolvam com corrupção. "Uma das
grandes coisas que aprendi em minha vida é a necessidade de ouvir o povo
antes de qualquer tipo de planejamento, ainda mais em um empreendimento
desse porte", sinalizou. "Com o planejamento que foi feito, pouca gente
da base da sociedade brasileira terá vantagens com esse projeto."

Prever impactos

"Para planejar é necessário estudar muito mais do que a viabilidade
técnica e econômica. É preciso saber o tipo de conhecimento que conduziu
aos projetos dentro de um plano de ações. Além de se preocupar com a
viabilidade ambiental, ecológica e social em relação ao entorno da
ocupação humana do espaço considerado, o bom planejamento envolve ainda
a previsão dos impactos que qualquer projeto desenvolvimentista
demanda", disse Ab'Sáber.
Segundo ele, em termos de planejamento, a previsão de impactos, que vem
logo depois da análise de todas as viabilidades -- e que, segundo ele,
deve ser feito por pessoas independentes desvinculadas dos interesses
comerciais do projeto --, é a "arte-ciência de saber o que vai acontecer
em diferentes profundidades do futuro".
"O conceito de prever impactos se caracteriza pela capacidade das
pessoas de entrar em um círculo de possibilidades mais viáveis do
conhecimento futuro. É a análise da cadeia de conseqüências de um
projeto sobre o que já está em um terreno em termos de ações antrópicas
e aquilo que foi remanescente de natureza", assinalou.

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