domingo, 30 de março de 2008

Águas do Velho Chico têm seu preço


Industriais, agricultores, empresas de abastecimento e outros usuários das águas do rio São Francisco vão pagar pelo uso a partir de 2009. É quando os representantes do Comitê da Bacia do São Francisco devem finalizar os cálculos para saber quem paga quanto e por que. A Agência Nacional das Águas (ANA) entregou ao comitê no final do ano passado o estudo final que avalia a economia da bacia. O levantamento aponta para viabilidade da cobrança com potencial para arrecadação anual de R$ 41 milhões, podendo chegar a R$ 60 milhões se considerada a transposição.
Por Bianca Melo, do jornal
O Tempo, MG, 23/03/2008.

No momento, está sendo feito o cadastramento dos usuários do rio. Conforme explica o gerente de cobrança pelo uso da água da Agência Nacional das Águas (ANA), Patrick Thomas, pagam praticamente todas as pessoas que usam água do São Francisco, mesmo os que pensam que são donos do trecho. “A água é um bem público e, mesmo que o rio passe pela sua casa, o uso tem que ser com outorga, para não acabar com tudo.”
Apenas duas bacias de rios nacionais, o Paraíba do Sul e o bloco formado pelos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ), instituíram a cobrança. Os dois juntos arrecadam R$ 27 milhões por ano. O comitê da bacia define as regras, com base na legislação, e a ANA envia os boletos para os pagadores, com possibilidade de divisão em 12 parcelas. É preciso criar também uma agência de bacia que vai acompanhar a cobrança e monitorar a qualidade da água.
Nas duas experiências de cobrança, o valor do metro cúbico é o mesmo: R$ 0,01.

Segundo o presidente do Comitê da Bacia do rio São Francisco, Thomaz da Mata Machado, no São Francisco a tendência é manter os mesmos preços, principalmente nos primeiros anos de cobrança. “A idéia é estimular racionalizações, tecnologias para usar menos água. Não é criar um novo imposto”, explica o presidente do comitê. Um dos principais temores quando se fala de cobrança de água é a sobrecarga de encargos, como acredita o presidente da Federação da AGRICULTURA e Pecuária de Minas (Faemg), Roberto Simões. “Sempre há o medo de que encareça o custo de produção para os pequenos, já tão penalizados.”
Nas palavras do presidente do comitê da bacia, para evitar injustiças, o comitê só vai cobrar água de quem gasta mais de quatro litros por segundo, o que dá 240 litros por minuto, uma quantidade considerável. Só para comparar, um morador da região central de Belo Horizonte gasta 200 litros médios diariamente. “Nenhum pobre vai pagar, a não ser como usuário da empresa de saneamento.”
A maior resistência, explica, em geral vem dos fazendeiros, grandes gastadores de água, muitas vezes com pouco controle. O consumo em toda a bacia do São Francisco está concentrado em abastecimento humano, indústria, irrigação (sobretudo na Bahia) e pecuária. Segundo Mata Machado, a tendência é que o valor pago caia com o passar do tempo, quando a agência da bacia estiver em condições de monitorar as variações na qualidade da água utilizada.

Belo Horizonte

Ao mesmo tempo que será iniciada a cobrança no rio São Francisco, seus afluentes - rios estaduais, como o das Velhas - também se preparam para cobrar. Neste caso, a população de Belo Horizonte pagaria também, indiretamente, devido à captação de água do rio feita pela Copasa. De acordo com projeções da Agência Nacional das Águas, considerando a população da capital mineira, cada usuário pagaria de R$ 0,52 a R$ 1 a mais na conta a cada mês.

No caso de plantio de banana irrigada, por exemplo, no Norte de Minas, o produtor pagaria R$ 13,78 por hectare a cada ano, considerando as regras da bacia do Paraíba do Sul. O impacto total sobre o custo de produção de alimentos irrigados está na média dos 0,24%, podendo chegar a 0,74%, segundo estudo feito pela ANA e pela Gama Engenharia. A AGRICULTURA é o único dos setores onde se aplica um redutor para que o valor seja compatível com a atividade.

Aplicação

A lei (nº 10.881, de 2004) é clara: o governo deve aplicar todo o recurso arrecadado na própria bacia. A cobrança é apontada como alternativa para obras de melhoria do rio. Thomaz da Mata Machado diz que os recursos devem ser investidos, a princípio, em gestão, monitoramento do rio e tratamento de esgoto em pequenas cidades. “Obra grande de saneamento não é possível fazer, é coisa para o governo federal.”
Pelo plano diretor do rio, finalizado em 2004, seriam necessários R$ 9 bilhões para recuperar totalmente o São Francisco nos cinco Estados que dividem a posse de suas águas: Minas Gerais (detentor de 73% das águas), Bahia, Alagoas, Sergipe e Pernambuco.

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